"Porque as pessoas que fazem cinema não se perguntam: até que ponto eu posso e devo usar essas imagens, até que ponto necessito de uma imagem ou não, até que ponto necessito desta imagem e deste som? E se quiser aprofundar isso, pode-se perguntar até que ponto deve ser feito cinema no Brasil, por que eu devo fazer cinema no Brasil. Se a resposta é sim, cabe perguntar porque devo fazer este filme e não outro. Até que ponto as pessoas vão continuar fazendo filmes sem se formularem esssas perguntas? A falta de inquietação vital e criativa é terrível. Usar porque é bonito, porque prova, porque ilustra, estas podem não ser razões criminosas, mas são razões más, e as pessoas precisam estar conscientes disso. A resposta pode ser: eu uso essa imagem porque eu sinto que preciso usar, não sei explicar. Isso me basta. Mas até que ponto toda cena de periferia tem que ter um rap? Ou uma imagem de favela deve ter samba? Até que ponto uma lavadeira que diz que é lavadeira precisa estar na imagem lavando roupa? No fundo é isso: as pessoas deveriam usar as imagens e os sons pensando por que estão fazendo isso. Proliferação de imagens e sons onde nada vale nada, por que isso? Por exemplo, em Santo Forte: por que vou usar a imagem de um menino soltando pipa? Até que ponto preciso utilizar a imagem de um culto religioso para provar que é verdadeiro? O mundo das imagens vai ficando tão pobre e tão restrito que, quando coloco em Santo Forte espaços vazios, essas imagens ganham uma força tremenda, justamente porque são raras dentro do filme."

"Eu estou interessado em conhecer, não posso transformar o mundo com um filme, já sei disso há mais de 20 anos. Se pudéssemos transformar o mundo com um filme, não sei se eu seria capaz de fazer esse filme. Temos de ter dados sensíveis, e os filmes podem dar esses dados. Se você não conhece não pode transformar direito. O que eu quero dizer é que se as pessoas soubessem que a religião não é exatamente o ópio do povo o socialismo não tinha dado na vertente que deu."

Eduardo Coutinho

"Estou aqui para dar boas e saudáveis sacudidelas mentais na platéia. A civilização passou a nos reguardar e proteger tanto que não conseguimos vivenciar emoções suficientes por conta própria. Portanto, para impedir que fiquemos lentos e moles, temos de vivenciá-las artificialmente, e o cinema é o melhor meio para isso".

Esse excerto é obra de Hitchcock, mas ilustra muito bem o que Francis Ford Coppola faz com seu espectador em A conversação. Nesse filme, escrito, dirigido e produzido por FFC, que dois anos antes havia lançado seu vigoroso Poderoso Chefão, a sintonia entre o desenvolvimento do personagem e da trama se dá de maneira impecável. Numa sobriedade que impressiona, a câmera de FFC traduz em imagens o dilema em que mergulha o personagem Harry Caul (em interpretação pra lá de inspirada de Gene Hackman). Sua apreensão nos é passada com precisão pelos enquadramentos enxutos (que nem por isso deixam de ter uma plasticidade incrível), de um dos maiores diretores de cinema vivos.

O roteiro, que começa pela construção do personagem, envereda pelo enredo e se desenvolve em crescente, atingindo o clímax (e que clímax!) no lancinante ato final. A trilha sonora, embalada pelo jazz da mais alta qualidade, contribui para fazer desse filme uma obra-prima da fértil década de 70.